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By Munemasa Katagiri
A brisa que soprava na janela daquele apartamento brincava com os cabelos de Mitsuru Sano. O sangue ainda pingava da faca que segurava, aproximou-se do parapeito e olhou o objeto confuso demais para acreditar no que havia acontecido. Pensou em jogar para rua, pensou em se atirar para a morte mas apenas olhou aquela faca deixando cair no chão frio sob seus pés descalços. Observou suas mãos onde o sangue coagulava ainda espantado pelo que foi capaz de fazer e sentou-se num canto encostado à parede abraçando os joelhos escondendo o rosto entre eles. Sentou-se e apenas chorou, não havia solução para o silêncio que substituía a agitação de antes. Não devia terminar assim, mas por que? O que poderia ter causado aquilo? As lembranças estavam estranhamente emaranhadas em sua mente, seu corpo sentia os efeitos do torpor provocado pela consciência recém recobrada. Tentou acalmar a respiração ofegante mas o cheiro de sangue invadia suas narinas provocando náuseas. Levantou-se e se aproximou mais do meio da sala, lá viu o corpo sem vida de Munemasa Katagiri caído entre o sofá e a mesa de centro, o tapete estava tingido de vermelho. Sano se sentou no sofá e começou a deslizar os pés nos ombros ainda quentes de Katagiri, nesse minuto pareceu dar conta dos fatos como se despertasse de um pesadelo lembrando dele logo em seguida. Em desespero virou o corpo de Katagiri, sentou-se em sua barriga e esbofeteou seu rosto com ódio. A culpa era toda do empresário, se ele não tivesse agido daquela maneira não teria acabado assim. Sentiu-se um inútil por falar com os mortos, deitou-se no sofá tentando organizar seus pensamentos lembrando de cada detalhe com raiva. A doce e agradável fragrância da cara loção parecia impregnada em seu corpo, por mais que ele fosse se lavar as marcas que Katagiri deixou nele jamais iriam sair.
Lembrou o quanto foi usado e seduzido, de como se sentia um brinquedo nas mãos daquele homem poderoso. Tinha medo e repulsa mas ao mesmo tempo era o que ele queria, os sentimentos confusos o irritavam mas ele tolerava para ter segurança. Porém, naquele dia, ele resolveu passar tudo a limpo. Aquilo estava revirando sua vida então sentiu necessidade de dar um basta, realmente esperava que uma conversa civilizada fosse o suficiente, então Sano bateu à posta de Katagiri sem aviso, este o recebeu bem como de costume mesmo estranhando e sem saber o verdadeiro motivo da visita. O garoto entrou e, como sempre, tirou seus sapatos dirigindo-se ao sofá em seguida, Katagiri sentou ao lado dele mantendo uma distância confortável, parecia não gostar do jeito do seu visitante naquele dia, ele estava muito quieto. O empresário se aproximou mais, Sano logo notou suas intenções e se afastou mas ele insistia, o garoto tirou os braços ávidos de cima dele com as mãos, finalmente Katagiri parou e recostou no sofá "Muito bem, o que você quer?" Sano, cabisbaixo, suspirou descontente "Não dá mais, senhor." Katagiri o fitava confuso "Eu não lhe dou o suficiente?" o garoto olhou para ele tentando disfarçar o pânico "Não é isso. Nós temos que parar com isso tudo, tá acabando comigo." Katagiri ajeitou os óculos escuros e se inclinou sobre ele "Deixa de besteira, guri!" segurou o queixo de Sano e o obrigou a beijá-lo, o garoto virou o rosto ofegante "Por favor, não! Eu não quero mais isso!" Katagiri riu e se levantou "Você não tem escolha." o empresário caminhou para a cozinha, Sano o seguiu "Me escute, senhor! Por favor!" Katagiri abriu a geladeira e pegou uma garrafa de sakê "Vai querer beber algo?" Sano se debruçou na pia olhando para uma enorme faca no escorredor "O senhor não quer escutar, não é?" mais uma vez o empresário riu, deixou a garrafa sobre a pia e encostou atrás de Sano "Se eu escutar você perderá muitas oportunidades. Você sabe que eu posso te dar a vida que você quiser." aproveitou o momento para acariciar o corpo do rapaz com malícia não ligando para suas súplicas, sem saber como reagir e nem ao menos o que sentir Sano segurou o escorredor "Pare, eu tou pedindo!" mas o homem não iria parar, já lhe abria o zíper enquanto beijava seu pescoço. Em desespero o jovem pegou a faca e se virou para Katagiri ameaçando com as mãos trêmulas, o empresário mais uma vez riu das atitudes de Sano e voltou para a sala deixando-o ali juntamente com a garrafa de sakê esquecida, lá pegou o maço de cigarros mas mudou de idéia colocando-o sobre a mesinha de centro enquanto sentava no sofá. Sano se dirigiu para a sala ainda segurando a faca, seus olhos assustados não conseguiam esconder o que se passava trazendo uma expressão confusa a seu rosto. Katagiri, que continuava a sorrir, convidou-o a sentar novamente, o jovem obedeceu sem entender como podia mas sem largar o objeto. Sano, apertando o cabo da faca, permitiu que Katagiri tocasse sua perna "Largue isso, garoto." o empresário tentava ser gentil com uma voz muito suave mas, mesmo assim, não era ouvido. Escondendo o rosto sob os longos cabelos aquele jovem parecia muito tenso e perdido em meio aos próprios sentimentos, odiava saber que Katagiri não iria parar e odiava ainda mais saber quer agradava ser tão desejado, tinha que fazer acabar de qualquer forma!
Sano se levantou, pensou em contornar a mesinha de centro mas parou no meio do caminho, o empresário o seguiu e mais uma vez o abraçou por trás "Solte essa faca e vamos conversar." o garoto novamente permitiu ser acariciado porém não deixava de apertar o cabo da faca "Pare, senhor!" Katagiri pretendia insistir até ter o que queria, ele sabia que Sano resistia mas sempre acabava cedendo "Parar por que se você está gostando?" o rapaz perdeu o controle, livrou-se do abraço num safanão e esticou a arma, suas mãos ainda tremiam. Katagiri não julgava aquilo como ameaça, aproximou-se dele de braços abertos mas percebeu estar enganado quando sentiu a lâmina fria lhe perfurar o estômago e rasgar sua carne subindo, afastou-se cambaleando enquanto o sangue invadia sua garganta e perdeu os sentidos caindo entre o sofá e a mesinha de centro com a vida se esvaindo.
Sano se lembrou de seguir para perto da janela como um zumbi, as lágrimas percorriam seu rosto, ainda não podia acreditar no que havia feito e não sabia se deveria ficar feliz por ter se livrado de um estorvo tão grande ou se deveria ficar triste com a saudade que apertava seu peito. Foi até onde a faca estava caída e a recolheu, colocou-se de joelhos em frente ao corpo de Katagiri e pediu desculpas enquanto rasgava seus próprios pulsos. Deitou-se sobre o corpo sem vida lhe acariciando o rosto, o sangue e as lágrimas se misturavam numa dança macabra. Sano sabia que pior do que viver como o assédio de Katagiri era viver sem ele.